Campo de Marte tem solo ameaçado em Santana

A coleta e o tratamento inadequados de resíduos industriais, como óleos lubrificantes, combustíveis e solventes, ameaçam o solo e os lençóis freáticos sob o Campo de Marte em Santana,  zona norte de São Paulo. O alerta consta do Estudo e do Relatório de Impacto Ambiental (EIA-Rima) do aeroporto, concluído no mês passado. Dos 22 hangares do mais antigo aeroporto do Estado, a maioria deles explorado por empresas privadas, apenas seis (27%) despejam o esgoto na rede coletora da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp). Na avaliação de técnicos e engenheiros contratados pela Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) para a elaboração do estudo, o risco de contaminação é “provável e bastante significativo”.

A área do aeroporto não é a única a ser afetada. Durante as vistorias, se verificou o lançamento de esgoto sanitário e industrial dos hangares – supostamente sem tratamento – nas redes de drenagem internas do Campo de Marte. Parte da vazão é direcionada para o córrego que circunda o aeroporto no sentido das cabeceiras da pista. O restante infiltra no solo ou escoa pelas galerias em direção ao Rio Tietê, contribuindo para agravar a poluição.

Também chamou a atenção dos engenheiros o número de fossas “antigas” e “em condições precárias de operação e manutenção” espalhadas pelo aeroporto. “Ocorre que cada empreendimento gerencia o seu sistema de fossa independentemente, desta forma muitos não possuem informação e/ou não realizam manutenção, acarretando em ineficiência do sistema, bem como problemas com odores, vetores (transmissores de doenças) e extravasamento”, diz o estudo.





Os problemas se concentram principalmente nos hangares, que, além de abrigo para aeronaves, servem também de oficinas de manutenção. De acordo com o relatório, boa parte deles lava aeronaves e veículos nos pátios, a céu aberto. Apesar de as redes de esgoto e drenagem pluvial parecerem independentes, ambas estão ligadas aos canais de drenagem do sítio aeroportuário, que, por sua vez, deságuam no Rio Tietê. Pode parecer pouco, mas, somados, os resíduos tóxicos despejados no rio por cada um dos hangares têm efeito significativo. Um mapeamento feito em 2007 por uma empresa contratada pela Infraero revelou que a produção de esgoto do Campo de Marte equivale a uma população média de 204 habitantes, o que representa 0,5% do total de moradores do distrito de Santana, onde o aeroporto está instalado desde a década de 1920.

Outra constatação preocupante foi a ausência de dispositivos de separação de água e óleo nos hangares. Segundo o EIA-Rima, nenhum deles apresentou equipamentos para tratamento de esgoto industrial gerado pelas atividades de lavagem e ou manutenção de aeronaves, como exige a lei. Os técnicos descobriram ainda que quase todo o volume de óleo descartado é doado ou retirado por empresas não cadastradas na Agência Nacional do Petróleo (ANP). As instalações das três distribuidoras de combustível do Campo de Marte – BR Distribuidora, Shell e Air BP – parecem ser as mais adequadas à legislação ambiental, embora os técnicos digam que, no caso da BR, não tiveram acesso a todos os dados do sistema de separação de água e óleo.

Para a engenheira química Adriana Carneiro Duarte, uma das envolvidas na elaboração do EIA-Rima, diversos fatores levam ao descumprimento das leis ambientais. “Desde o desconhecimento da legislação até questões que envolvem custos para adequação”, explica. Ela lembra que a Lei Federal nº 9.605, de 1998, estabelece sanções penais e administrativas para quem lesar o meio ambiente – a responsabilidade recai sobre o agente das atividades.

Nos próximos dias, a Secretaria Municipal do Verde e Meio Ambiente deve agendar audiências públicas para apresentar o estudo, oportunidade para moradores e associações de bairro debaterem os resultados com técnicos e autoridades.





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